terça-feira, 6 de dezembro de 2011

A história de cada um

             A professora se vê diante de 4 ou 5 notas. Foram pesquisas, atividades e provas aplicadas aos alunos, corrigidas pela professora e a partir de uma referência, medidas em forma de notas.
               Aí um empasse: não alcança a média aritmética de 5. A professora deixa a nota  suspensa, até porque ficou preocupada com o panorama geral do aluno, e diz que decidirá no dia do conselho de classe.
             Agachado no canto da mesa da professora, o aluno vem e conversa baixinho. Fala do casamento recente da mãe e da depressão dela, de nome para filhos, dos castigos físicos sofridos por ele e pela irmã, da ausência do pai que nunca conheceu, da exigência da mãe para que vá bem na escola.
               A professora sou eu. Ouço tudo aquilo e me transporto para aquele mundo de caos e penso: e eu aqui somando mais um problema para essa vida mergulhada na confusão: a nota. Seria possível alcançar os objetivos da disciplina diante desta realidade? Esse jovem conseguirá aprender conceitos e procedimentos, cada vez mais deslocados da sua realidade? O modo como acolhemos ou não esse contexto certamente deixa marcas na vida deste ser. Essas marcas compõem a história que nos faz sujeitos, mas eu gostaria que fossem as melhores possíveis. A reprovação não me parece a solução.
               Como manter a sensibilidade e a delicadeza na relação entre professor e aluno? Afinal, somos da mesma matéria humana e não preciso reprimir para ser respeitada e ter o meu trabalho reconhecido.








segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Entre fracassos, queixas e o sonho de uma escola melhor

               Na escola são muitos os acontecimentos que no afã do momento podem passar despercebidos e ao relembrá-los nos apresentam uma riqueza de ensinamentos.
               Hoje presenciei uma cena muito comum na escola: atendimento a uma mãe, convocada pelos professores para tomar ciência das notas e comportamentos de uma aluna.
  Uma jovem de 13 anos, cursando o 7º. ano, muito bonita, vivaz, inteligente, questionadora e por vezes agressiva ou, seria mais prudente dizer, ‘na defensiva’.  Mãe e filha sentam-se à frente de meia dúzia de professores que tecem observações e avaliações da menina e sua conduta em sala de aula. Que anda petulante, que não faz o que se pede, que não cumpre tarefas, que não estuda e tem notas baixas nas provas. Séria candidata a reprovar de ano, pois muitos professores ainda veem nessa medida a única possibilidade de resgatar no aluno a responsabilidade e garantir um pouco de dignidade a nossa profissão, já que assim mostramos que há consequências para nossas escolhas.
A mãe, indignada com as atitudes da filha e mostrando-se envergonhada, diz não entender, afinal a filha tem tudo o que precisa e pode dedicar-se aos estudos apenas.
Relatei aqui uma situação bastante comum no cotidiano da escola. Ainda mais comum é a família não atender ao chamado. Mas o que me chamou a atenção aqui?
Primeiro pensei no quão constrangedora foi a situação, para a mãe, para a filha e, com nuances, para os professores. Foi um momento de expor todas as limitações e fracassos de todas as partes, e isso não é agradável. Era visível a relação de poder – em vantagem para a instituição, que dita as regras não cumpridas.
Na menina, com olhar raivoso e distante, penso não criará mudanças positivas imediatas, afinal só ressaltou o quanto todos apontam para ela as suas fraquezas e o quanto, mergulhada nelas, o caminho mais fácil acaba sendo o ataque. Para a mãe, só mais um sinal do quanto é difícil educar e de como podemos ser surpreendidos por desconhecermos o sujeito que cresce ao nosso lado e que em muitos momentos torna-se indecifrável.
Os professores, imbuídos de boas intenções, com certeza, pensam que uma aliança com a família pode ser o caminho e que listar todos os defeitos daquele ser pode ser um passo importante para recuperá-lo. Estes profissionais, muitas vezes – salvo iniciativas pessoais, não refletem sobre suas ações pedagógicas do ponto de vista do sentido e efeito delas. Serviu para quê aquele momento de verborragia faltando apenas dois dias para o conselho final de classe? Achei que só para ampliar os ressentimentos. É claro que mergulhados no dia a dia da escola, essa saída acaba sendo a possibilidade efetiva de fazer algo, mas precisamos mudar o rumo dessas conversas, não é?
Não tenho respostas, até porque já participei de conversas como essa e o que sempre fica é o mal estar ou o alívio  de passar a bola para a frente. Na realidade da sala de aula, nenhuma mudança. Nem na menina, pauta da conversa, nem na aula que quase sempre é mesmo desmotivante, repetitiva, passiva, autoritária, entediante.
Sei que temos o argumento de que os alunos estão lá para aprender, mas preciso ser realista e constatar que pouco tem sido feito para fazer da escola um lugar interessante do ponto de vista do conhecimento.
Uma aula mais criativa, organizada, com subsídios para o debate dos alunos pode sim ser mais interessante. Ainda ficam de fora aqueles que estão na escola pela mais dura obrigação, mas conquistamos sim o desejo e o respeito de muitos.
Vejo também exemplos de sucesso nas práticas de alguns professores da escola pública. Às vezes eu consigo, mas preciso de tempo para preparar aulas melhores, produzir materiais interessantes, estudar a fundo os temas e suas aplicabilidades.  Eu quero e sinto necessidade de construir essa “outra escola”. Estou começando com as minhas aulas e meu sincero desejo de levar os meus alunos por essa ponte imaginária que os ligue ao mundo encantador do conhecimento, do sonho de um mundo melhor.